O sentido dessa festa. Qualquer templo construído pelas mãos  humanas é símbolo da Igreja. De fato, damos o mesmo  nome a todas essas construções: "igreja" com letra minúscula. Enquanto  que "Igreja", com letra maiúscula faz referência à comunidade convocada  por Deus à fé em seu filho Jesus Cristo, que  se reúne num templo para dar-lhe culto. A igreja-templo é  um símbolo da Igreja-comunidade. Os muros do templo delimitam um  ambiente sagrado, dedicado à oração pessoal e comunitária, à celebração  da eucaristia e dos demais sacramentos, aos atos de louvor  a Deus.
Se isto vale para qualquer tempo, imaginemos a  importância que tem a catedral nas dioceses. A catedral representa  toda a Igreja local, guiada pelo bispo, que é o  sucessor dos apóstolos. A catedral "representa" a comunidade local. Se  estamos viajando e vemos numa cidade uma catedral bonita pensamos:  "Que grande deve ser a fé dos cristãos deste lugar,  que construíram uma obra tão esplêndida para manifestar seu amor  a Cristo!". Por isso no aniversário da consagração da catedral  é um dia de festa para todas as dioceses.
O  bispo de Roma, sucessor de Pedro, é por mandato de  Jesus Cristo o pastor universal de toda a Igreja. Por  isso sua catedral, que se chama são João de Latrão  está dedicada a são João Batista e a são João  Evangelista, e consagrada a nosso Salvador, simbolizando toda a Igreja  universal. É esta a festa que hoje celebramos: a dedicação  da basílica de são João de Latrão, que é, como  diz a inscrição no seu pórtico: "Mãe e cabeça de  todas as igrejas de Roma e do mundo". Quando lembramos  este bonito templo, construído no século IV, logo após o  fim das perseguições, lembramos de todas as demais igrejas que  foram construídas durante os séculos. Celebramos o Senhor, que instituiu  sua Igreja para reunir na unidade, sob a guia de  Pedro e de seus sucessores, toda a humanidade.
1.  O templo, lugar santo. O antigo templo de Israel foi  construído por Salomão que viveu por volta do ano de  960. O Templo está edificado com grande suntuosidade e custodiava  "a arca da aliança". No deserto, Deus se encontrava com  Moisés na tenda. Davi, pai de Salomão, pergunta-se, por sua  vez, como é possível que ele viva num palácio e  o Senhor numa tenda. Contudo, sabia-se que Javé não poderia  estar contido num templo feito por obra de mão humana.  Salomão mesmo na oração da dedicação do templo de Jerusalém  exclama: "Mas será que Deus pode realmento morar sobre a  terra? Se os mais altos céus não te podem conter,  muito menos esta casa que eu construí! Mas atende, Senhor  meu Deus, à oração e à súplica do teu servo,  e ouve o clamor e a prece que ele faz  hoje em tua presença. Teus olhos estejam abertos noite e  dia sobre esta casa, sobre o lugar do qual disseste:  ‘Aqui estará o meu nome!’ Ouve a oração que o  teu servo te faz neste lugar." (I Re 8, 27-29).  Notamos, portanto, a tensão entre a transcendência de Javé e  a tentativa de colocá-lo num lugar determinado, o templo. Anteriormente  Salomão já tinha escutado a seguinte advertência: "Por esta Casa  que estás edificando, se caminhas segundo meus preceitos, ages segundo  minhas sentenças e guardas todos os meus mandamentos para andar  conforme eles, eu cumprirei minha palabra contigo, a que disse  a Davi teu pai, habitarei em meio dos filos de  Israel e não abandonarei meu povo Israel". Assim se tentava  superar a antinomia: de fato, Javé habitará no templo, se  o povo caminha segundo os preceitos e sentenças recebidas.
O  templo foi para Israel a sede da presença divina. O  templo da casa de Deus, especialmente quando a arca da  aliança é nele introduzida. A nuvem encheu templo do Senhor  (I Re 8, 10). Graças à presença de Javé, o  templo é o lugar do culto e da oração. Quando  Ezequias recebe a carta ameaçadora de Senaquerib, a lê e  sobe ao templo, abrindo a mesma diante do Senhor, rogando-lhe  (II Re 19, 14). Os salmos e outras passagens bíblicas  apresentam templo como a morada de Deus (Sal 27, 4;  42, 5).
O templo também foi para Israel um sinal  da escolha. Javé tinha decidido habitar naquele lugar, naquela cidade,  e protegê-la do inimigo. O templo construído representava para os  israelitas a fidelidade de Deus às suas promessas. Por esta  razão, a destruição do templo por parte de Nabucodonosor foi  um duro golpe para a fé de Israel. Esta pequena  visão histórica nos ajuda a compreender melhor as características próprias  do templo cristão.
2. O templo cristão. Primeiramente, é conveniente  ressaltar a atitude de Jesus sobre o templo judeu. "Jesus,  como os profetas anteriores a Ele, teve pelo Templo de  Jerusalém o mais profundo respeito. Nele foi apresentado por José  a Maria quarenta dias após o seu nascimento. Com doze  anos, decide ficar no Tempo para lembrar a seus pais  que deve dedicar-se às coisas do Pai. Durante os anos  de sua vida oculta, subiu ao Templo a cada ano,  no mínimo por ocasião da Páscoa; até seu ministério público  foi ritmado por suas peregrinações a Jerusalém para as grandes  festas judaicas. Jesus subiu ao templo como lugar privilegiado de  encontro com Deus. O Templo era para ele a morada  e seu Pai, uma casa de oração, e se indigna  pelo fato de seu átrio externo ter-se tornado um lugar  de comércio. Seus discípulos lembram-se do que está escrito: ‘O  zelo por tua casa me devorará’ (Sl 69,10). (Jo 2,16-17).  Depois de sua ressurreição, os apóstolos mantiveram um respeito religioso  pelo Templo. Contudo, no limiar de sua Paixão, Jesus anunciou  a ruína desse esplêndido edifício, do qual não restará mais  pedra sobre pedra. Há aqui o anúncio de um sinal  dos tempos finais que vão abrir-se com sua própria Páscoa.  Esta profecia, porém, pôde ser relatada de modo deformado por  testemunhas falsas no momento do interrogatório de Jesus diante do  sumo sacerdote, sendo-lhe atribuída como injúria quando ele foi pregado  à cruz. Longe de ter sido hostil ao Templo, local  que aliás, ministrou o essencial de seu ensinamento, Jesus fez  questão de pagar o imposto do Templo, associando este a  Pedro, que acabara de estabelecer como fundamento de sua Igreja  futura. Mais ainda: identificou-se com o Templo ao apresentar-se como  a morada definitiva de Deus entre os homens. Eis por  que sua morte corporal foi decretada anuncia a destruição do  Templo, (destruição) que manifestará a entrada em uma nova era  da História da Salvação: ‘Vem a hora em que nem  sobre esta montanha nem em Jerusalém adorareis o Pai’ (Jo  4, 21)." (Catecismo da Igreja Católica, 583-587)
Portanto, Jesus respeita e  venera o templo, mas sua paixão, morte e ressurreição indicam  a destruição definitiva do templo, pois ele mesmo é o  novo templo, onde verdadeira e definitivamente está a plenitude da  divindade (cf. Col 2, 9). Diz o cardeal Ratzinger: "O  culto cristão, ao contrário, considera definitiva e teologicamente necessária a  destruição do templo de Jerusalém: no lugar dele está agora  o templo universal de Cristo ressuscitado, cujos braços estendidos na  cruz se dirigem para o mundo para atrair todos ao  abraço do amor eterno" (Ratzinger J. Introduzione allo spirito della  liturgia, p. 45). Em Jesus existe um novo templo e  um novo e definitivo sacrifício. De agora em adiante existe  um único sumo sacerdote com um único sacrifício. Tudo isso  nos diz que a liturgia cristã é, por essência, universal,  e se dirige a todos os povos da terra.
Na  maioria das religiões os templos não são lugares de reunião,  mas espaços culturais reservados à divindade. No caso do templo  cristão é diferente. O templo tomou o nome de domus  ecclesiae (casa da igreja, casa da assembléia que se reúne).  Assim, a palavra Igreja chega a significar não somente a  comunidade reunida, mas também o edifício. Isso significa que é  o próprio Cristo que celebra o culto. Ele é o  culto dos fiéis nos momentos em que eles se reúnem.
Hoje celebramos a dedicação ou consagração da domus ecclesiae por  excelência, já que se trata da catedral do bispo de  Roma, de modo que é "mãe e cabeça de todas  as Igrejas de Roma e do mundo". A basílica de  Latrão hospedou todos os papas a partir de Constantino até  o ano de 1304. Nela realizaram-se cinco concílios (os dos  anos 1123,1139,1179,1215, e 1512).
3. O cristão, templo de Deus.  A segunda leitura retirada da primeira carta aos Coríntios nos  diz: Não sabeis que sois templo de Deus e que  o Espírito de Deus habita em vós? O amor de  Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que  nos foi dado. O templo de Deus é sagrado e  vós sois este templo de Deus. Que grande dignidade tem  o cristão: foi configurado com Cristo, pertence ao corpo de  Cristo, é templo de Deus! O cristão é o lugar  da manifestação de Deus. Quando lembramos hoje a dedicação da  Igreja mãe de todas as Igrejas do mundo, lembremos também  nossa condição de "Templo de Deus".
1. O amor  à Igreja. Se tem algo que essa festa hoje nos  convida é a incrementar nosso amor à Igreja. Entendendo-se Igreja  na sua explicação mais profunda: sacramento universal de salvação. A  Igreja é em Cristo um sacramento ou sinal e instrumento  da união íntima com Deus e da unidade de todo  o gênero humano. Amar a Igreja significa amar o Papa,  cabeça visível da mesma; a amar a Igreja significa alimentar-se  de sua doutrina com fé; amar a Igreja é sentir-se  parte viva da mesma, "pedra viva". Por isto, o amor  à Igreja nos leva a ser apóstolos para transmitir aos  outros a alegria de encontrar a salvação em Cristo Jesus.  A Igreja é mãe e mestra: nela recebemos o batismo  e os sacramentos. Ela nos acompanha no nosso peregrinar humano  a caminho do céu.
2. O cultivo da vida de  graça. Já que somos templo de Deus e o Espírito  Santo habita em nós, devemos cuidar muito nossa alma para  hospedar a tão grande hóspede. Saibamos valorizar nossa dignidade como  pessoas e como cristãos. Hoje as seduções do pecado são  múltiplas e o diabo "anda como leão buscando a quem  devorar". Resistamos firmes na fé, porque Deus é fiel às  suas promessas. Defendamos nossa vida de graça, fortalecendo-a com a  oração e os sacramentos. Procuremos a penitência se temos a  desgraça de perder a graça em algum momento.
Autor: Pe. Octávio Ortiz, L.C. | Fuente: Sacerdos - CATHOLIC.NET

